1. A ESTRUTURA DO TELEJORNAL
A produção de telejornal é provavelmente, a tarefa mais estressante da linha de montagem da televisão. Cabe à produção, uma série importante de decisões que determinam a direção do trabalho de todos os atores envolvidos na composição do telejornal. Tudo começa pela seleção do fato que, por sua abrangência, atualidade e potencial imagético, vai se transformar num VT clássico: off-passagem-sonora.
Há outros acontecimentos que serão reportados mas, quer pelo menor peso jornalístico ou por falta de tempo e logística, os editores os transformarão em notas cobertas (por imagens) ou peladas (sem imagens), stand-up (passagem mais longa do repórter no local do fato) ou loc vivo (imagens e locução ao vivo do apresentador).
Todo o esforço heróico se justifica: os telejornais noturnos detêm os maiores índices de audiência em todas as emissoras e grupos de comunicação. Por definição, eles resumem os principais fatos do dia, e uma omissão ou apuração deficiente, principalmente para o telespectador que assiste a mais de um telejornal, é fatal para a credibilidade do veículo.
No telejornal apresentado por Zélia Cavalcante, há espaço para uma média diária de sete matérias, no modelo padrão: passagem, off e sonoras, e algumas notas, entre as cobertas, peladas e notapés. O foco da cobertura são as “notícias duras” que, ainda segundo Alfredo Vizeu, podem perder a atualidade se não forem dadas, como uma sessão de CPI dos precatórios ou uma blitz policial. Em segundo plano, entram as notícias de serviços, que visam orientar o telespectador-cidadão sobre direitos e deveres.
Cerca de 15 profissionais atuam na produção, reportagem e edição do jornal. O tempo é ínfimo. A pressa e o dever de entregar o trabalho muitas vezes impossibilitam qualquer investigação mais acurada. Mas isso é um lugar-comum presente em todos os manuais de jornalismo
a. Linha editorial
O Jornal da Pajuçara Noite, assim como os demais jornais noturnos, fazem uma retrospectiva dos fatos mais importantes do dia, sendo freqüente, que tenham conteúdos idênticos, pois os critérios de escolha das matérias em destaque, parecem ser compartilhados por um bom número de produtores.
2. PRODUÇÃO
A. SELECIONANDO A NOTÍCIA
“O compromisso fundamental do jornalista é com a verdade dos fatos. Seu trabalho se pauta pela apuração precisa dos acontecimentos e sua correta divulgação. Não se pode, mesmo sob a pressão do deadline, deixar de apurar uma informação até o fim.”
verbete: Apuração - Manual de Telejornalismo Rede Record
Aparentemente é uma rotina repleta de imprevistos e reviravoltas, mas o conhecimento e a experiência que o produtor vai acumulando acabarão por conduzir o trabalho a uma sistematização e planejamento de cobertura relativamente estáveis. Importante contribuição nesse sentido encontra-se na leitura de “A Reportagem: Teoria e Técnica de entrevista e pesquisa jornalística”, do pesquisador Nilson Lage. Para ele, todos os fatos sociais jornalisticamente relevantes podem ser enquadrados em quatro tipos:
a) Eventos programados: julgamento de acusados, votações em assembléias, inaugurações de obras e os sazonais: início de ano letivo, vendas de fim de ano, mobilização de bóias-frias para a colheira etc.
Exemplos disso foram as matérias sobre o caso Fernando Aldo, as assembléias do Sindicato dos Policiais Civis (Sindpol), orientações do Procomun sobre a compra de material escolar, aquecimento no comércio etc.
b) Eventos continuados: greves, festejos, pontos de estrangulamento no trânsito.
Também aí há fartos exemplos: greve dos servidores estaduais: Movimento Unificado da Saúde, dos Policiais Civis, delegados, professores; as obras da prefeitura e os transtornos para os motoristas etc.
c) Desdobramentos (suítes): acompanhamento de investigações policiais, recuperação de vítimas de atentados ou acidentes, repercussão de medidas econômicas.
Exemplos: Operação Taturana, Carranca, Navalha, Sururu, Saturação; O aumento do salário mínimo e a injeção de recursos na economia local etc.
d) Fatos oriundos da observação direta: mudanças de costumes, ciclos da moda, deterioração ou recuperação de zonas urbanas.
Apesar de dedicar-se originalmente ao jornalismo impresso, Mário Erbolato estabelece critérios para a classificação da notícia que são inerentes a formação da pauta de todos os meios de comunicação. Em “Técnicas de Codificação em Jornalismo”, ele traça o panorama mais abrangente sobre as características que elevam um fato do cotidiano à categoria de assunto de interesse público.
(p.61)
“Proximidade (...) eventos que ocorrem perto do leitor e a ele ligados.”
Marco geográfico: fato que ocorre em outro lugar mas gera conseqüências na realidade local.
“Impacto: (...) acontecimentos chocantes ou impressionantes”
“Proeminência: tudo o que se refere a pessoas importantes encontra interessados”
Aventura e conflito: assassinatos, rixas, golpes
Conseqüências: será publicado quando puder afetar o País
Humor: história escabrosas e divertidas
Raridade: foge da rotina, são fatos diferentes e inusitados.
Progresso: melhorias na qualidade de vida
Sexo e idade: sensacionalismo
Interesse pessoal: serviço
Interesse humano: buscar nas experiências de pessoas que vivenciaram o evento, encontrando nesses relatos emocionados um complemento para a frieza das estatísticas
Importância: a amplitude das repercussões do fato determinam sua relevância
Rivalidade: explora o antagonismo de competições, partidos;
Utilidade: atendem estreita faixa da população; tem interesse restrito mas seguro
Política editorial do jornal: tema que o jornal destaca ou omite
Oportunidade: é o gancho da matéria, o desdobramento recente que atualizará informações previamente apuradas
Dinheiro: loteria acumulada, vida dos ricos
Expectativa ou suspense: quando a cobertura continuada da história desperta o interesse e a identificação do público que fica aguardando os desdobramentos do fato
Originalidade: confunde-se com raridade, mas tem uma dose de místico
Culto de heróis: gestos de patriotismo e de bravura de homens
Descobertas e invenções: cura de doenças e aparelhos eletrônicos
Repercussão: acontecimentos que envolvem brasileiros em outros lugares
Confidências: assunto de paparazzi, da cobertura da estrelas
B. AS FONTES
A disseminação do uso da internet, a saturação das redações dos veículos tradicionais, as limitações de tempo do jornal e da TV em menor grau, as dificuldades técnicas dos radiojornais em freqüência AM, tudo contribuiu para a implantação e o sucesso dos sites noticiosos. Alagoas 24 Horas, Tudo na Hora, AL em Tempo Real, Alagoas Agora, Primeira Edição são as principais fontes de notícias na hora em que o produtor está procurando a pauta factual.
Como são produzidos no curtíssimo espaço de tempo, com a intenção declarada de dar furos em outros veículos, as notícias dos sites são os textos mais sujeitos à verificação de informações. Eis o que outro verbete do Manual de Telejornalismo diz sobre apuração: “Desconfie sempre da notícia divulgada por terceiros. Apure, apure e apure.” P.25. E sobre Internet: “Na maioria dos sites, a cobrança por um grande número de notícias, em pouco tempo, conduz os profissionais desse setor ao erro.” P.26
Outro recurso é a caixa de mensagens da redação. Abarrotada de releases de instituições públicas, empresas privadas e de entidades do terceiro setor, um e-mail redacao@pajucara.com recebe uma média diária de 15 sugestões de pauta. Embora pouco utilizadas, as mensagens institucionais já salvaram a pele de muito produtor em final de expediente.
É possível traçar uma linha do tempo da divulgação de notícias. Pelo menos as mais polêmicas, que geralmente rendem coletiva de imprensa. Portanto, na cobertura dos fatos mais quentes do dia os rádios vencem a corrida seguidos de perto pelos sites noticiosos, guias freqüentes da produção das televisões que, por sua vez, ditam as matérias de capa dos jornais do dia seguinte.
A agenda de telefones, item precioso do produtor, geralmente entra como fonte de informação em momento mais críticos, em que nada de relevante acontece e é necessário se desdobrar em especulações e observações pessoais para dar origem a uma pauta. Após formular a suposição é hora de telefonar para a fonte, confirmar a suspeita sob o foco pré-estabelecido, ou numa conversa informal descobrir outras situações que rendem matéria.
O banco de pautas é a memória do telejornal. Seu arquivo, a memória de eventos acompanhados pelo foco, contatos e informações importantes. Costuma ser utilizado em matérias suitadas, que abordam o desdobramento de um fato e necessitam de uma breve retrospectiva que é dada pela pauta anterior.
Jornais impressos, os últimos na cadeia de transmissão de informações dos meios, não vivem apenas de notícia velha, muitas vezes antecipam acontecimentos que não podem passar despercebidos ao olho atento do produtor.
Ausência de rádio-escuta: na redação há um rádio que fica ligado boa parte do tempo, mas não é fonte primária de interesse. Não há um profissional exclusivamente atento a este meio, produzindo relatórios e sugerindo matérias, figura comum em redações de jornais. Geralmente o humilde aparelho fica ligado, e se surgir algum assunto de última hora no noticiário virtual, freneticamente sintoniza-se várias freqüências, em busca da cobertura do assunto. É item indispensável, quando muda-se o rumo da cobertura e o itinerário do repórter. Quando o produtor subsidia a equipe na rua com informações pelo telefone celular.
A ronda pelas fontes: Recurso que consiste em ligar com regularidade para as fontes em busca de informações que possam render pauta. É atividade rara na rotina da redação da Pajuçara, é instrumento usado quando se questiona a ocorrência de um desdobramento possível de fato já noticiado.
C. PROCEDIMENTOS PARA A APURAÇÃO
Contatos: Feitos por telefone, o produtor e estagiários coletam as informações iniciais com o entrevistado. O repórter precisa ter uma noção clara de matéria em questão, da abordagem a ser utilizada, das perguntas relevantes e das possíveis imagens.
Há uma lista de 10 pontos a serem preenchidos na pauta padrão da TV Pajuçara:
- Retranca: duas ou três palavras chaves. Deve ser idêntica durante todo o processo para evitar confusões e erros: da produção pauta, à redação da matéria, à ordenação das matérias no espelho.
- Jornal: JPN, ou seja, Jornal da Pajuçara Noite. Apesar de que, “99,997% das matérias que compõe o JPN são reprisados no Jornal da Pajuçara Manhã” segundo o editor-geral Marcus Toledo.
- Data e hora: data de amanhã e o a hora da primeira entrevista. Há dois horários padrão para as reportagens. Pela manhã são às 8h30 e às 10h e à tarde de 14h30 e 16h. Sujeitos a todo tipo de imprevisto, esses horários são pouco cumpridos e é freqüente a produção, ligar para o entrevistado, ora avisar do atraso do repórter ou mesmo cancelar o encontro.
- Entrevistados: Hora da entrevista. Nome do entrevistado. Cargo, função ou profissão e número de contato. Se houver, na pauta deve constar o contato do assessor de imprensa.
- Local: Por ordem cronológica são dispostos os locais, endereços e pontos de referências onde os entrevistados se encontram à hora marcada.
- Foco: assunto principal da matéria; funciona como um título
- Fato: composta das circunstâncias do acontecimento dispostas em ordem decrescente de importância. Quando há entrevistas com personagens, a pauta traz um breve relato da relação da pessoa com o assunto principal.
- O que queremos: é um misto de direcionamento e justificativa para a matéria. Qual o interesse público contido no assunto, o que deve ser mostrado, o que precisa ser explicado. Traz também dúvidas. Dados que, por qualquer motivo, não puderam ser conhecidos no momento da apuração. Dependendo do horário da ligação, do expediente do entrevistado (em caso de fontes oficiais), do tempo apertado e de uma série de outros fatores, não é incomum que a lista de perguntas para as sonoras, ocupem várias linhas. As dificuldades da apuração serão melhor explicitadas no capítulo seguinte.
- Sugestão de imagens: muitas vezes relegada a segundo plano, as imagens são a verdadeira essência do telejornalismo. É o que define e diferencia este modo de produção dos demais meios. Não se resume apenas ao banal “gerais e de apoio”. Há pequenos detalhes, passagens do texto, que precisam de correspondentes visuais. Nem o repórter, preocupado com as marcações e a passagem, ou o cinegrafista que raramente tem contato com a pauta, trazem boas imagens para a redação, fazendo o inferno para os editores de imagem.
- Anexos: traz informações secundárias que auxiliam o repórter a contextualizar e entender o foco da matéria. Oriundos de pesquisa na internet ou de pautas anteriores, o campo anexos contém excertos de leis, documentos de consulta, ou retrospectiva dos fatos.
D. DIFICULDADES E PECULIARIDADES DA PRODUÇÃO VESPERTINA
A orientação básica da produção na TV Pajuçara é fornecer o máximo de informações possíveis, subsidiar o repórter com todas as nuances do fato e sugerir um direcionamento para o mar de dados coletados.
A voz é responsável por apenas 25% da comunicação humana. A apuração por telefone é física e limitada.
Claro que às vezes é impossível cumprir à risca a norma, pois no dia-a-dia encontramos dificuldades que não estão explicitadas em nenhum manual de jornalismo. Habitualmente ligamos para fontes que estão no trânsito, em reunião, muito ocupadas para atender, que estão em casa e não tem acesso aos documentos no trabalho, ou que simplesmente não nos atendem. Para a loucura de qualquer produtor são situações que derrubam qualquer boa-vontade ou boa matéria.
As conseqüências dessas dificuldades são, no mínimo, uma pauta deficiente. Falta informação, as poucas que existem estão confusas ou truncadas, o foco perde nitidez, e uma série de outras deficiências que o repórter deve contornar, mas que são inevitáveis em certos momentos de azar.
i.Vícios e erros comuns
O produtor é um verdadeiro estrategista da redação. Planeja a cobertura, sugerindo foco, marcando entrevistas, e ainda sugerindo imagens. Envolve uma certa noção de logística para coordenar tempo e locações que a equipe deve cumprir. Cito como exemplo uma pauta sobre DENGUE/PERIGO em que havia vários malabarismos entre bairros distantes, transporte de entrevistados, situação agravada pelo trânsito caótico do primeiro trimestre de 2008. Conseqüência previsível, não houve tempo de fazer a outra pauta, sobre a convocação da reserva técnica do concurso dos policiais militares. Isso um dia depois, de a Assembléia ter arquivado a mensagem de redução do duodécimo, uma economia de 30 milhões dos quais metade iria para a Defesa Social, e segundo o então secretário da pasta, Paulo Rubim, seria diretamente aplicado para a incorporação de mil aprovados.