Jenifer Leão

Saturday, December 30, 2006

uma geração versus a tecnologia

Sunday, December 24, 2006

Manifesta!


MANIFESTA, CAPETA!

Umbanda, Neopetencostal, Catolicismo, Psicanálise, Espiritismo

Será que o diabo ainda provoca medo na sociedade contemporânea?

Jenifer Leão

Satanás, demônio, Lúcifer, diabo, belzebu, chifrudo, coisa-ruim, tinhoso, capeta, o cão, mefistófeles, sete-peles. A imaginação humana foi pródiga em criar denominações para o anjo caído. Desde o menino mais velho de Vidas Secas a Riobaldo de Grande Sertão: Veredas, o homem se questiona de onde provêem todo o mal que assola a sua existência. Será que o diabo ainda provoca medo na sociedade contemporânea?

Pelo menos, o cinema acha que sim. A “satanofobia” é um recurso exaustivamente usado pela milionária indústria do entretenimento que se apropria de lendas e temores humanos para posterior comercialização. Imersas em seu cotidiano de ações agendadas, as massas buscam a satisfação e o prazer através da exploração terrificante do sobrenatural. Contorções insólitas, voz gutural pronunciando línguas mortas, força descomunal, excreções fétidas. Assim são os relatos mais comuns de possessão demoníaca. Elementos pontualmente presentes nos sucessos de bilheteria: O Exorcismo de Emily Rose e O Exorcista. Este último, em especial, é considerado o filme mais aterrorizante de todos os tempos, mais uma prova da irresistível fascínio e horror que o tema satânico ainda provoca.

Umbanda

Na Umbanda, a figura de Exu vai ser construída num amálgama de suas funções no Candomblé e de sua percepção como demônio cristão. Sua identificação com o diabo, decorre do fato de que o culto africano era perseguido e reprimido nos primeiros anos de escravidão, Sua aparência e personalidade: chifres, fogo, luxúria desenfreada, encontram pontos de semelhança com a representação tradicional do diabo cristão. Matreiro e burlador, por ser o ente mais próximo dos homens é o que melhor os compreende, até em seus desejos vingativos, e é a ele que se roga o mal alheio. Além disso atende questões ligadas a luxúria, a problemas cotidianos, à magia negra, fatores que se assemelham às clássicas funções de satanás.

Também sua posição em hierarquia inferior torna Exu um espírito mais acessível, sendo muitas vezes incorporado em sessões de possessão, na qual o contato com sobrenatural acontece através da incorporação de entidades espirituais, momentos em que o possuído é despojado de suas idiossincrasias e passa a agir sob sua influência.

Igreja universal do reino de deus

A figura do capeta está ostensivamente presente na retórica da Igreja Universal do Reino de Deus. Localizada em diversos pontos da cidade, seus templos opulentos estão cheios de homens e mulheres que cantam em voz alta, mãos levantadas ao céu, animados por um pastor que grita palavras de ordem em tom autoritário e professoral. A Igreja Neopenntecostal se arroga o direito de ser os contadora de Deus, fazendo da fé um produto pago a prestações. “O dízimo é sagrado. Tudo que passa pela mão de vocês deve ser dizimado. O que não for dizimado o diabo tira” dizia o pastor. Os testemunhos são a face mais eloqüente da pregação. Ailton Joseilton da Silva, agora obreiro da Universal, explica que já chegou a mendigar, após perder o emprego, devido a uma macumba que sua sogra teria feito. Todo o dinheiro colhido era entregue à Igreja, o que frustrava imensamente sua mulher, “tentada pelo diabo!”, interrompeu o pastor. Após sete anos, ele consegue um emprego de padeiro, juntando dinheiro suficiente para montar o próprio negócio, e hoje possui quatro casas e onze terrenos. “Como Jesus, na cruz é necessário sacrificar. Você dá o que você não tem. A Universal não é igreja de rico não, é de pobre. Mas antes de tudo a fé. É preciso ter fé, e doar a igreja por amor a Deus.”

Não bastam as menções a figura diabólica, é preciso representá-la, torná-la viva, próxima e aterradora.

Os endemoninhados. Terça-feira, 19 de dezembro, quarta sessão de descarrego. Nesse dia, ao invés do habitual terno e gravata, o pastor e os obreiros vestem branco, à maneira dos pais e mães de santo. A analogia não se limita a indumentária... O pastor ordena então que os fiéis coloquem às mãos sobre a cabeça e fechem os olhos. Todos obedecem, a não ser algumas crianças ainda inconscientes do espetáculo que será promovido em instantes. Um som de terror trash toca ao fundo. Os obreiros andam de um lado a outro do corredor. “Se manifesta, Exu, se manifesta Pomba-Gira!” brada energicamente o pastor, “Você que tomou o marido da outra!”,”Você que destruiu a vida daquele!”. Ele convida então as pessoas que estão passando por momentos difíceis a subirem no palco, logo, filas se formam no altar. Novamente ele pede que elas ponham as mãos sobre a cabeça e mantenham os olhos fechados, enquanto ele se reveza com outro pastor nos gritos e ordens para que os espíritos se manifestem. Os obreiros já seguram os cabelos de algumas pessoas e sussurram em seus ouvidos. Finalmente, gritos histéricos se ouvem, e uma mulher é levada a frente do altar. Uma voz rouca e quase indistinguível diz: “sou o bagaceira”. O espírito relata que se apossou do marido quando ele tentou apunhalar a mulher. Confessa também impedir que o filho dela deixe as drogas. Enquanto segura fortemente o cabelo da mulher, o pastor incita a multidão: “Queima Jesus, queima!”, todos gritam e gesticulam, como a jogar algo para trás: “Em nome de Jesus, sai, sai, sai!”. Exorcizada uma única mulher, apesar de outras terem também encenado a possessão, o espetáculo termina, todos aplaudem. O pastor pode então ofertar um conjunto de DVD e CD gospel.

Os fiéis são, em sua maioria pessoas de baixa renda, desempregados e desiludidos amorosamente, em busca de uma igreja que reconheça os seus problemas cotidianos e que dê uma resposta satisfatória e urgente. É fácil entender a sedução que a Universal exerce num estado com profundas desigualdades e escassas possibilidades de ascensão social.

“O diabo tenta, mas nunca acima de nossas forças”. A Igreja Católica não reconhece essas manifestações como possessão demoníaca e sim encenações de pura ignorância e fanatismo religioso. Padre Henrique Soares, demonologista, jamais presenciou em Maceió um caso real de possessão, caracterizando-o como muito raro “Nunca presenciei uma possessão em sentido estrito, agora a obsessão sim e a infestação. Obsessão é quando a pessoa é provada pelo diabo, fisicamente, então a gente faz uma oração de Libertação, já a infestação ocorre quando a gente sente que em um ambiente há forças malignas.” Para ele, as Igrejas Neopetencostais não têm qualquer discernimento no que se refere à possessão: “Está com dor de dente? Está possesso.(...) e isso faz qualquer psicólogo sério rir, porque vê que é sugestão é histeria.” A cautela é o tom da abordagem católica que, antes de designar um exorcista, exige uma bateria de exames científicos “Se pede a ajuda de um profissional, um psicólogo, um psiquiatra, para ver se o mesmo (caso) não tem um causa natural.”

As ciências da mente. A psicologia pontifica essas manifestações como originárias de crises pessoais: “são surtos psicóticos, crises histéricas, manifestações de um arquétipo, que o sujeito vai incorporar, trazendo a tona tudo que faz parte do imaginário social que o ser humano vem acumulando ao longo da história” esclareceu o psicólogo e professor universitário Ricardo Maia.

A psicanálise, campo controverso de ciência e mito, foi a primeira a desmistificar as crises histéricas como fruto de uma repressão social e não como apoderação diabólica: “As mulheres tidas, na Idade Média, como bruxas ou possuídas pelo diabo, na verdade eram histéricas, que sofriam uma repressão muito grande da sociedade por sua condição de mulher, e que acabavam implodindo tudo isso, dando origem a todos aqueles sintomas estereotipados” afirmou Maia. Para ele, ainda, é muito comum, em lugares de forte tradição religiosa, haver indivíduos que por ouvirem durante toda a vida o discurso religioso, representam em nível inconsciente todos os infortúnios como manifestação satânica: “É um discurso que vem sendo inculcado na sociedade. Dentre os sistemas de representação coletiva, a religião como forma de conhecimento mais arcaico, mais antigo, sedimentou-se no repertório da humanidade, o que acaba repercutindo nos momentos de crise do ser humano, nas manifestações do inteiramente outro, do estranho, do inconsciente, de conteúdos que foram excluídos como também o próprio diabo que foi expulso do céu.”

Espiritismo. Ao contrário do que é ensinado nas aulas de catecismo, para o espiritismo kardecista nunca existiu Lúcifer, o anjo caído. Como num socialismo espiritual, Deus não teria criado tamanha desigualdade em níveis espirituais entre os seres, portanto não há a concepção de anjos e santos, nascidos belos e perfeitos, tão cara a Igreja Católica, explicou João Alves, presidente do centro espírita José Euzébio.

A evolução espiritual por meio de sucessivas reencarnações é a base da doutrina espírita. Após a devida depuração e superação de si mesmo pode então o espírito se tornar pleno. Na vida pós-morte, o espírito passa a habitar uma outra dimensão paralela a dos viventes, embora seja ainda dotado da personalidade e índole anteriores. E é aí, que se manifesta o mal como conhecem os espíritas, na aparição do espírito de uma pessoa que matou, roubou, estuprou. Às vezes os espíritos vingativos buscam desequilibrar psicologicamente os indivíduos, chegando a provocar surtos e mesmo, o suicídio. Ou podem vir à procura de ajuda numa sessão chamada de desobsessão, na qual os demais membros do centro espírita tentam se comunicar com o espírito que perturba o obcecado, procurando entendê-lo e ajudá-lo.

Num país cristão, o demônio detém lugar certo no imaginário popular. Num país pobre, ele está em todos os lugares incertos, na miséria, na fome, nas doenças. Pior ainda, na ignorância de um povo, que não responsabiliza o homem individual por seus erros, atribuindo a culpa a entidades fora do controle humano. No país das desigualdades e indiferenças, o diabo é o presidente que, acompanhado de seu séqüito de demônios, estabelecem o inferno na terra, a cada guerra, a cada criança que morre sem cuidados, a cada salário de fome, a cada menino que o tráfico ganha, a cada omissão. Há o medo, mas não do verdadeiro mal.

Sunday, December 17, 2006

James Bond Cassino Royale

Logo após ser promovido a agente 00, Bond se mete numa enrascada ao explodir a embaixada ungandense matando vários guardas e diplomatas. Ele está em busca do núcleo financeiro de uma corja de terrorista: o banqueiro Le Chiffre. Nesse ínterim, é duramente repreendido por sua chefe, sendo acusado de precipitado e arrogante, características que moldam as ações do calouro agente. São lutas, tiros, explosões, glamour, luxo e amor. Amor? Sim, pois é em Cassino Royale que James sofre a sua primeira paixão e traição, o que explica o caráter frívolo com que ele tratou as mulheres posteriores, usando-as como instrumento sexual e/ou de sobrevivência.

O filme atende a todas as expectativas de um blockbuster típico e, apesar de se remeter as origens de Bond, é encenado na época atual. Possui a narrativa frenética dos últimos filmes, salvaguardando, claro, a evolução tecnológica, que está habilmente minimizadaa em um carro Aston, um telefone GPS e as mini-bombas terroristas.

Eva Green como a contadora se revela uma agradável surpresa e a candidata ideal ao grande amor de Bond. Sua atuação demonstra em dose certa um misto de espirituosidade e vulnerabilidade com pitadas de um mistério oculto detrás de seus olhos excessivamente maquiados.

Daniel Craig, desenvolve com razoável competência seu papel; sua feiúra devidamente perdoada nas cenas em que saindo do mar, as gotas deslizam por seu corpo escultural –eufemismo. Fica então explicada a disposição física para as cenas de perseguição em andaimes, para as lutas nas escadas, no prédio afundando...

De resto, o filme segue seu curso normal, normal quero dizer previsível, não mais que o esperado. Embora tenha quase três horas de duração, a direção de Martin Campbell foi muito competente em dopar-nos de adrenalina entremeada por raros diálogos.