Baixio das Bestas de Cláudio Assis: anotações
O filme é incompleto, curto.
Os sentidos metafóricos se diluem na narrativa. Nenhuma resposta satisfatória nos é dada sobre o destino dos personagens.
Por isso, não quero ser porta-voz dos anseios de um moralismo cristão à moda de Lucíola de José de Alencar ou Atração Fatal de Adrian Lyne. Anseio é pela estrutura formal, pelos fundamentos do começo meio e fim, mesmo que invertidos, como em Amnésia. É pela falta da coerência dos destinos dos personagens, pela improviso, que Baixio deixa a desejar.
Em Baixio das Bestas, o último sinal de pureza, representado pela jovem explorada pelo avô, se degrada e degenera após um estupro há muito tempo anunciado (ela é a única personagem que tem um fim). O espectador espera nauseantemente o pior. Não faz nenhum sentido que uma moça, exposta daquela forma a todos os caminhoneiros da área, passe imune por todo aquele deserto de cana-de-açúcar. Caio Blat repete o comportamento odioso do adolescente irresponsável de Cama de Gato. Realiza impunemente uma série de crimes que são “abrandados” na sua visão de MMM (menino mimado da mãe).
A fossa que nunca termina, a morte do velho, o destino da prostituta e do vilão ruivo (Nachtergaele) não sabemos ao final qual o carma de cada um. Não há julgamento de valor, de moral, conservadora ou liberal. Situações com um potencial sígnico catártico se perdem em uma sucessão de cenas dispensáveis. A fossa que nunca é concluída, se enfatizada, revelaria que a bosta do mundo permanece mesmo é na superfície. A podridão do mundo.
Aquelas bestas vicejam num interior perdido de Pernambuco, tripudiando sobre cada um dos sete pecados capitais. Sem Deus, sem Alá, sem nada. Só o agora, gozar o agora, estuprar o agora, matar o agora. Estas pessoas existem e são maioria, apesar de estarem a margem da sociedade do consumo, da educação, da saúde, da expressão cultural.
Sou brasileiro e não desisto nunca. É tragicômico esse mote. Blat atropela um ciclista e apreensivo descobre que ele não morreu. Como diz o seu amigo essa gente não morre fácil. Se morresse já tava todo mundo morto.
O naturalismo cru da obra de Cláudio nos remete sempre ao conhecido livro de Aluísio de Azevedo: O Cortiço. O desfile de diversas personagens, cada uma com seus vícios, a presença da figura imaculada, que cedo ou tarde, será maculada pela convivência com esses tipos, o ciclo de perversão hereditária, o homem bom que se degrada pelo meio - o determinismo histórico. Todos são elementos presentes na obra de Cláudio Assis. Uma visão pessismista, mas não menos pessimista que a realidade.
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